Comissão de Cultura da Câmara debate taxa sobre obras de arte em aeroportos

publicado: 15/08/2018 12h12,
última modificação: 15/08/2018 18h21

Participantes foram unânimes na reprovação à alteração da cobrança, considerada risco à realização e ao acesso a exposições internacionais no Brasil.
Participantes foram unânimes na reprovação à alteração da cobrança, considerada risco à realização e ao acesso a exposições de arte internacionais no Brasil.

A Comissão de Cultura da Câmara dos Deputados debateu em reunião realizada nesta terça-feira (14) o impacto negativo da nova política de taxação sobre obras de arte adotada recentemente por concessionárias de aeroportos brasileiros.

As concessionárias dos aeroportos de Guarulhos, Viracopos e Galeão passaram a cobrar taxas de armazenagem com base no valor de mercado das obras, o que elevou os valores a níveis considerados exorbitantes pelos realizadores de exposições internacionais. O critério anterior levava em conta o peso das obras, que eram classificadas na categoria “cívico-cultural”.

Requerido pela deputada federal Raquel Muniz (PSD-MG), que preside a comissão, e coordenado pelo deputado federal Jean Wyllys (PSOL-RJ), o encontro contou com a participação do diretor do Departamento de Promoção Internacional do Ministério da Cultura (MinC), Adam Muniz; do presidente substituto do Instituto Brasileiro de Museus (Ibram), Marcos Mantoan; da presidente da Associação Nacional de Produtores Independentes de Artes Visuais, Ana Helena Curti; e do diretor administrativo da Pinacoteca de São Paulo, Marcelo Dantas.

Representando o MinC na reunião, Adam Muniz abriu sua fala lembrando que é dever do Estado, conforme o Artigo 215 da Constituição Federal, garantir o pleno exercício dos direitos culturais, o acesso às fontes da cultura nacional e o apoio e incentivo à valorização e difusão das manifestações culturais. Após apresentar informações sobre a contribuição da cadeia produtiva brasileira da cultura, Muniz avaliou que a mudança na cobrança de taxas alfandegárias sobre obras de arte por aeroportos brasileiros é um risco ao cumprimento do preceito constitucional citado e traz prejuízo ao setor cultural.

Para o representante do MinC, a alteração no critério de cobrança sobre o armazenamento de obras de arte foi feita de forma arbitrária, sem busca do diálogo, previsibilidade e sem levar em conta o interesse público. Em sua avaliação, a mudança, feita sem existência de fato novo que a embase, causa prejuízo para eventos culturais já contratados e prejudica eventos futuros por conta da insegurança jurídica e expressivo aumento de custos, o que se refletirá na redução do fluxo de cargas destinado ao setor cultural e na arrecadação. Muniz lembrou que diversos projetos na área, hoje financiados pela Lei Rouanet, teriam que prever um custo muito maior, onerando o contribuinte.

Isolamento e risco ao acesso

O presidente substituto do Ibram, Marcos Mantoan, lembrou que o Brasil possui hoje mais de 3,7 mil museus mapeados, que há mais de duas décadas conseguem importar bens culturais sob regime de admissão temporária conforme tarifa especial para eventos cívico-culturais estipulada pela Aeronáutica, a qual vinha garantindo integração cultural internacional. Destacando que o Brasil ocupa desde 2011 o topo do ranking das exposições mais visitadas do mundo, sendo a maioria delas gratuita e com conteúdo internacional, Mantoan afirmou que a alteração na cobrança terá “efeitos funestos para a cultura brasileira” ao tornar eventos deste tipo “inacessíveis, quando não inexistentes”, e que MinC e Ministério dos Transportes devem normatizar a questão por meio de portaria.

A presidente da Associação Nacional de Produtores Independentes de Artes Visuais, Ana Helena Curti, avaliou que a definição de evento cívico-cultural não pode ser feita pelas concessionárias de aeroportos e destacou o isolamento cultural que a medida acarreta. “Não vamos apenas deixar de ver exposições: vamos deixar de estar no cenário internacional de arte, numa rede internacional para o qual lutamos barbaramente para entrar”, disse, sublinhando a perda de imagem do brasil no exterior. “Espero que tenhamos a oportunidade de reverter isso ou vamos prejudicar a vinda de conteúdos estrangeiros e diálogos que podem ser firmados entre o Brasil e outras nações”.

Na mesma linha, o diretor administrativo da Pinacoteca de São Paulo, Marcelo Dantas, lembrou que o intercâmbio cultural internacional é uma via de mão dupla e destacou que a realização de exposições com conteúdo estrangeiro no Brasil é fundamental para a formação dos visitantes, que têm na maior parte acesso gratuito a elas, o que se tornaria inviável com a mudança na tarifa. “Estamos isolando o país e inviabilizando o acesso de quem não teria possibilidade de visitar essas exposições em outro lugar”, afirmou. “Essa arbitrariedade pode inviabilizar toda a cadeia operatória dessas exposições”.

Presente à audiência, a museóloga Claudia Porto, em nome do comitê brasileiro do Conselho Internacional de Museus (ICOM Brasil), reforçou o entendimento do Ibram no sentido de normatizar o assunto em conjunto com os órgãos responsáveis pela regulação dos aeroportos. Também presente ao encontro, o deputado federal Floriano Pesaro (PSDB-SP) apresentou requerimento para que o diretor-presidente da Agência Nacional de Aviação Civil (ANAC) preste esclarecimentos à Comissão de Cultura sobre a alteração na cobrança de taxas sobre a armazenagem de obras de arte em aeroportos brasileiros, sugerindo a criação de uma força-tarefa sobre o tema. A audiência pública pode ser assistida na íntegra aqui.