Chá de Museu na Rocinha mobiliza comunidade

publicado: 05/02/2010 14h12,
última modificação: 06/04/2011 14h14
Movimento pró-museu cresce entre moradores
Latas d’água que remetem ao tempo em que era preciso percorrer quilômetros a pé para matar a sede, modelos de brinquedos que passaram de geração para geração, como pipas e carrinhos de rolimã, maquete do modelo de barraco de pau a pique, predominante nos anos 40, apresentação de rodas de capoeira, que fazem reverência às raízes afro-brasileiras, relatos de moradores que vivenciaram toda formação e transformação de uma das maiores favela do país, que reúne cerca de 56 mil habitantes. Um movimento a favor da memória e do resgate da história da Rocinha, na cidade do Rio de Janeiro, vem crescendo. No último sábado (30) a comunidade realizou um ato inaugural – o primeiro Chá de Museu, com a participação de lideranças comunitárias, moradores e de representantes do Departamento de Processos Museais do Instituto Brasileiro de Museus (DPMUS – IBRAM).

A ideia de criar o Museu da Memória e História da Rocinha Sankofa vem sendo discutida desde 2007, entre agentes culturais, educadores, militantes sociais locais e técnicos do Ibram. Desde então, O ponto de cultura Centro de Cultura e Educação Lúdica da Rocinha e o Fórum Cultural da Rocinha têm mobilizado a comunidade com o levantamento da memória e história local, realizando entrevistas e coletas de material para composição do acervo.

Também está em andamento a favor do museu a organização do acervo produzido entre 1974 e 1986, que constitui o livro Varal de Lembranças.

Morador da Rocinha desde os dois anos, Robson Pacífico, 43, artista plástico, músico e ativista cultural, diz que a necessidade de se criar um museu é antiga porque a comunidade de certa forma não se conhece e desconhece sua história. “A Rocinha sofreu muitas mudanças que não foram registradas. Há muitas pessoas novas aqui e muitas antigas também. O movimento pró-museu está se solidificando a cada dia”.

Para Antônio Carlos firmino, 43, morador da Rocinha há 16 anos, professor de Geografia e um dos responsáveis pelo projeto do museu na comunidade, diz que o Museu da Rocinha se concretizou a partir do momento em que saiu do campo das idéias para o das ações . “Desde o momento em que começamos a fazer circular o acervo para que a comunidade se veja nesse museu, ele vem ganhando forma. Mas os moradores também estão ansiosos em saber sobre o espaço físico deste museu.”

Outro projeto em gestação na comunidade é a elaboração de um conjunto de painéis de grafite realizado por grafiteiros da Rocinha e de outras comunidades do Brasil, com p objetivo de contar a história de ocupação e desenvolvimento do território da favela. O projeto deve ser lançado ainda no primeiro semestre de 2010, com o apoio do Ibram.

Segundo o diretor do Departamento de Processos Museais do Ibram, Mário Chagas, a história da Rocinha acompanha o próprio desenvolvimento da história do Rio de Janeiro e é uma referência importante na cidade. “A comunidade reúne imigrantes nordestinos, mineiros e de outros estados e regiões do país. Vale ressaltar que a história da Gávea em torno da qual a Rocinha se desenvolve foi palco das famosas corridas automobilísticas no tempo das baratinhas, nos anos 40 e 50, em que teve como corredor de destaque Chico Landi. Tudo isso faz parte da memória da Rocinha e da memória da cidade e deve estar presente no museu”.

O museu comunitário na Rocinha pretende ser uma ferramenta de inclusão da comunidade, apresentando ao conjunto da população suas narrativas sobre quem são seus moradores, suas trajetórias de vida e como enxergam a cidade como um todo. De acordo com Firmino, o museu vai se pautar principalmente no direito dos moradores ao território. “ A Rocinha só existe porque as pessoas se organizaram, lutaram pelo direto à terra, liberdade e moradia. Muitos que vieram do Nordeste contam que a Rocinha parecia um quilombo.”

Por que Museu Sankofa ? Sankofa é uma Palavra Akan das nações africanas de Ghana e da Costa do Marfim que significa “devemos olhar para trás e recuperar nosso passado para podermos nos mover para frente; e assim compreendermos o porquê e como viemos a ser quem somos hoje”. Uma das formas de representação do museu baseia-se na imagem de um pássaro mítico que está com os pés plantados firmemente para frente e com a cabeça olhando para trás, como certo guia para planejar o futuro.