Durante muito tempo, a mulher esteve presente na arte apenas como inspiradora e musa, à margem do processo criativo. Mas esse papel não lhe cabe mais, e os museus brasileiros são prova disso: as coleções estão repletas de obras feitas por mulheres, que expressam o olhar de sua época e a insistência feminina em participar do mundo e do período em que vivem por meio da criação artística.
No mês em que se comemora o Dia Internacional da Mulher, 8 de março, um roteiro pelos museus do Ibram/MinC no Rio de Janeiro oferece um panorama da trajetória feminina na arte brasileira.
No Museu Nacional de Belas Artes (MNBA), no Museu Histórico Nacional e no Museu da República, por exemplo, estão obras da pintora Georgina de Albuquerque (1885-1962), uma das precursoras da participação das mulheres nas artes plásticas no país. Georgina rompeu com o academicismo após uma viagem à França, em 1906, e em 1952 torna-se a primeira mulher a dirigir a Escola Nacional de Belas Artes, onde mulheres só puderam entrar a partir de 1879. A artista obteve menção honrosa no Salão Nacional de Belas Artes de 1909 por seu quadro Supremo Amor e a partir daí, seu talento foi reconhecido no cenário artístico nacional.
Primeira caricaturista a despontar no Brasil, Nair de Teffé (1886-1981) foi outra dessas pioneiras. Nair retratou todos os presidentes de Deodoro da Fonseca a JK, além de figuras da sociedade do século XX, por meio de portrait-charges ou retratos caricaturais. A artista começou sua carreira na revista Fon-Fon! (1907) e teve caricaturas divulgadas em publicações francesas (Le rire, Excelsior, Fémina e Fantasio. Seu trabalho pode ser visto no Museu Histórico Nacional e no Museu Imperial, entre outros.
As mulheres também participaram ativamente do estopim do movimento modernista. Anita Malfatti (1889-1964) e Tarsila do Amaral (1890-1973) ajudaram a renovar a arte brasileira inspiradas na brasilidade.
Em 1917, Anita chocou São Paulo ao apresentar uma mostra com 53 de seus mais arrojados trabalhos e recebeu de Monteiro Lobato uma crítica tão violenta que levou Oswald de Andrade, Menotti Del Picchia e Mário de Andrade a publicar artigos em sua defesa. Juntou-se ao movimento modernista Tarsila do Amaral, que estruturou sua personalidade artística a partir de influências cubistas, durante seus estudos em Paris, na Académie Julien. Depois de uma viagem às cidades históricas mineiras, o contato com o barroco brasileiro associado às teorias e práticas cubistas, ela criou uma pintura denominada Pau Brasil. Em 1926, Tarsila inicia sua fase antropofágica, de retorno ao primitivo, que tem como referência o quadro Abaporu.
O MNBA guarda algumas de suas obras. No mesmo museu, pode-se conhecer ainda o talento de Djanira (1914-1979) que, inspirada em trabalhos de mulheres modernistas, tornou-se uma das grandes intérpretes do movimento no Brasil. Ela apareceu no panorama cultural brasileiro em 1942, participando do Salão Nacional de Belas Artes e teve como temas o retrato, o futebol, a música popular, as atividades circenses, o teatro, além de suas pinturas sobre trabalhadores. Djanira fez várias viagens pelo interior, conhecendo os costumes e movimentos folclóricos do povo, enriquecendo sua temática e exploração de cores, composição e formas.
Um novo redirecionamento da arte brasileira acontece a partir de 1951, tendo como marco a 1ª Bienal de Artes de São Paulo. A bienal – cuja organização teve participação decisiva de uma mulher, a escultora Maria Martins – inspirou a criação do Manifesto Neoconcreto no Brasil.
Falar em neoconcretismo é falar em Lygia Pape (1927-2004) e também em Lygia Clark (1920-1988), que, dentre outras experiências inovadoras, consolida a performance na história da arte ao utilizar o corpo como parte da obra. O legado das duas artistas integra, por exemplo, o acervo dos Museus Castro Maya (Museu da Chácara do Céu e Museu do Açude), ao lado de obras de Fayga Ostrower. Outras artistas contemporâneas como Mônica Barki, Ana Bella Geiger, Marta Niklaus, Malu Fatorelli e Iole de Freitas também estão presentes nos acervos dos museus Ibram/MinC.