Teia da Memória 2010: Pontos de Memória vão integrar Programa Cultura Viva

publicado: 31/03/2010 13h25,
última modificação: 06/04/2011 13h27
Encontro fortalece representantes dos pontos de memória das cinco regiões do país
Seguindo o Museu Cortejo, unidos e embalados por canções e marchinhas de luta e alegria, os cerca de 40 participantes da Teia da Memória – representando 16 comunidades das cinco regiões do país, finalizaram o encontro, neste domingo, dois de março, percorrendo o Dragão do Mar, em Fortaleza – CE, levantando o estandarte de um futuro promissor rumo ao desejo e direito à memória atendidos com os pontos de memória. O evento não só proporcionou o compartilhamento de ideias, anseios, desafios e definição de estratégias, como também marcou, no primeiro dia (26), a parceria que o Instituto Brasileiro de Museus – Ibram vinha articulando desde o início do projeto com a Secretaria de Cidadania Cultural do Ministério da Cultura – SCC /MinC , para a integração dos Pontos de Memória ao Programa Cultura Viva, assegurando mecanismos de investimentos para o desenvolvimento da iniciativa e integração aos pontos de cultura. 

De acordo com a coordenadora da SCC – MinC, Jô Brandão, a proposta do Projeto Pontos de Memória, que vem apoiando comunidades que já realizam ações de memória , merece o apoio da secretaria por seguir a mesma linha de atuação dos pontos de cultura a partir da filosofia do “do-in” antropológico, introduzida pelo ex-ministro da Cultura Gilberto Gil.

“Desde a 1ª Teia da Memória, em 2009, em Salvador, percebemos essa interação com a proposta dos Pontos de Cultura. Desde então o Projeto Pontos de Memória está no nosso colo com todo cuidado, porque sabemos da importância da memória para o fortalecimento do processo de identidade das populações que não foram oficializadas pela história. Acredito que a melhor forma de apoio seja por meio de convênio, de forma que garanta o desenvolvimento dessa iniciativa”, diz.

A coordenadora de Museologia Social e Educação do Ibram, Marcelle Pereira, enfatizou o resultado positivo da parceria. “É uma alegria para o Ibram apoiar esta iniciativa de transformação social através da memória. A integração dos pontos de memória aos pontos de cultura é um avanço, uma conquista. Saímos daqui fortalecidos e com espírito multiplicador.”

O primeiro dia de encontro também contou com a apresentação da representante da Organização dos Estados Ibero-americanos – OEI, Cláudia Castro, e com palestra de um dos sócio-fundadores do Museu da Maré, no Rio de Janeiro, Antônio Carlos Vieira, que falou sobre a experiência do museu pautada no protagonismo comunitário.

Na ocasião, Antônio Carlos Vieira, conhecido como Carlinhos da Maré, convidou os participantes a refletir sobre o poder transformador da memória. “Falar de memória é falar da vida e do tempo. Memória são experiências vividas e também pode ser a construção do que não vivemos. Como pontos de memória podemos legitimar nossa história a partir da nossa perspectiva. Com o Museu da Maré, passamos do sentimento de vergonha para o sentimento de orgulho do lugar onde vivemos.” Ele também enfatizou que não há uma receita pronta para a criação de museu. “O museu deve ser considerado um processo vivo, que muda a cada dia, de acordo com o contexto.”

No segundo dia foi apresentado o leque de propostas de oficinas a serem oferecidas pelo Ibram e, em grupo, foram elaboradas as proposições apresentadas na plenária Teia das Ações e no Fórum Nacional dos Pontos de Cultura – FNPC. As propostas passam pela integração dos Pontos de Memória ao Programa Cultura Viva, respeitando suas especificidades e necessidades, garantindo-lhes mecanismos de financiamento e desenvolvimento, à criação de um grupo temático denominado “Memória e Museus” na instância do FNPC, para propor políticas públicas para o setor.

O terceiro dia de encontro foi marcado pela palestra sobre inventário participativo do coordenador de Patrimônio Museológico do Ibram, Cícero de Almeida. Segundo ele, o inventário deve lidar com as várias forças representativas da comunidade, em harmonia, e a participação tem de pressupor a capacidade de lidar com a diferença. “A participação é o grande foco deste projeto. Durante o inventário, o grande desafio é perceber a igualdade na diferença e a diferença na igualdade. O que selecionar? Selecionar é pensar no conjunto complexo de possibilidades em conjunto com a vida.”

Para finalizar, a Roda de Memória propiciou integração entre os representantes dos pontos, que puderam contar histórias da comunidade e falar sobre suas expectativas. “As pessoas estão perdendo as memórias do bairro. Mas acredito que este momento marca o começo de uma grande história, com diversas representações da comunidade se organizando pela mesma questão. O museu vai ajudar o Sítio Cercado, que só é lembrado como lugar de violência”, disse Palmira de Oliveira, do Museu de Periferia – MUPE, do Sítio Cercado, em Curitiba.

Livaldo Degásperi apresentou a proposta do Ponto de Memória da comunidade de São Pedro, no Espírito Santo, pautada na história de luta pelo território, registrada através das Ruas da Resistência, Conquista, Luta e União.

Representando o Ponto de Memória do Horto, no Rio de Janeiro, Emília de Souza levantou o conflito que a comunidade vem enfrentando pela permanência no bairro e o papel da memória nesse combate. “Sabemos que a memória é tão importante que os inimigos querem se apropriar dela. Ela é o nosso maior instrumento. A comunidade está coesa se apropriando da idéia do Museu de Percurso Vila do Horto.”

Viviane Rodrigues, moradora do Jacintinho, em Maceió – AL, disse que a memória pode ser considerada um canal de comunicação do território. “Temos um movimento jovem e estamos trabalhando para além do resgate da memória. Para nós, a memória é passagem de conhecimentos. E é assim que falaremos do nosso território e de nossa rede”. “Saio daqui mais fortalecida, com muita vontade de trabalhar e colocar nosso museu para funcionar”, disse Deuzâni Noleto, do Ponto de Memória da Estrutural, no Distrito Federal.

Da comunidade do Coque, em Recife, Rildo Fernandes, disse que o local onde mora é um ponto turístico que precisa ser revitalizado e ter a sua história contada. “Acredito que com o Museu do Mangue do Coque esse quadro vai mudar para o homem-caranguejo. Quem não sabe nadar e dançar não pode viver no coque,” finalizou com aplauso do grupo.

Pontos de Memória – O Ibram acredita que o direito à memória precisa ser conquistado, mantido e exercido como direito de cidadania, como direito que precisa ser democratizado e comunicado entre os diferentes grupos sociais existentes no Brasil. É por esse direito e luta que está desenvolvendo o Projeto Pontos de Memória – resultado de parceria com o Programa Mais Cultura e, agora, com a Secretaria de Cidadania Cultural , do Ministério da Cultura, o Programa Nacional de Segurança com Cidadania – Pronasci, do Ministério da Justiça, e a Organização dos Estados Ibero-americanos.

O projeto vem apoiando ações de memória em comunidades de todo o Brasil. Estão em fase de consolidação 12 Pontos de Memória, situados em comunidades populares nas cidades de Belém- PA, Belo Horizonte – MG, Brasília – DF, Curitiba – PR, Fortaleza – CE, Maceió – AL, Porto Alegre – RS, Recife – PE, Rio de Janeiro, Salvador – BA, São Paulo – SP, Vitória – ES.

Também estão em desenvolvimento, com apoio do Ibram, iniciativas comunitárias a partir de realização de oficinas temáticas e consultorias técnicas e grupos envolvidos nas ações de preservação da memória local. Como exemplo de tais iniciativas, destacamos o Ecomuseu da Amazônia (Belém – PA), os Museus Sankofa da Rocinha e Vila do Horto (Rio de Janeiro – RJ) e o Museu Vivo do São Bento (Duque de Caxias – RJ).

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